Agência CT&I
Felipe Linhares
29 de julho de 2016
A crise econômica afetou gravemente as estruturas de governança dos países. No entanto, alguns modelos brasileiros começaram a apresentar sinais de baixa antes mesmo de o mundo sentir os impactos do colapso financeiro iniciado em 2014. É o caso do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. A análise é do economista Carlos Américo Pacheco e do físico Carlos Henrique de Britto Cruz.
Durante o ciclo de debates promovido pela Associação de Funcionários da Finep (Afin), nesta quinta-feira, ambos especialistas apontaram para o esgotamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que a partir de 2003 começou a ser usado para financiar ações transversais. Na prática, esse mecanismo permitiu que os recursos dos fundos setoriais, que a anualmente dispõem de R$ 5 a 6 bilhões, fossem aplicados em políticas mais amplas.
“Na minha opinião foi aí que o FNDCT começou a entrar em colapso. O fundo foi usado para financiar 200 mil coisas, sendo algumas delas complexas como o programa Ciência sem Fronteiras. O recurso chegou inclusive a substituir parte do montante que o Tesouro nacional antes repassava para o Ministério da Ciência e Tecnologia”, avaliou Pacheco, que já dirigiu o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) e o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA).
O economista defende uma reformulação na estrutura financeira do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI) para sustentar a crescente demanda por recursos. Segundo Pacheco, a engenharia financeira feita no final dos anos 1990 reformulou e, por quase duas décadas, sustentou o FNDCT. “Atualmente nosso sistema de financiamento é extremamente inadequado para o compartilhamento de risco tecnológico. Ele não funciona mais e é incapaz de resolver os problemas do SNCTI, que cresceu no tamanho e, consequentemente, na demanda”, disse.
O físico Carlos Henrique de Britto Cruz recordou os progressos brasileiros nos últimos 20 anos, principalmente a formulação de um marco regulatório para as atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I). “Hoje temos entidades empresariais falando e demandando pesquisas. Isso entrou na pauta deles. Também ganhamos um crescimento do sistema e das linhas de crédito para PD&I, mas não é só jogar recursos no Sistema Nacional de CT&I para as coisas melhorarem”, avalia Cruz, que é diretor científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Embora tenham havido ganhos e importantes conquistas científicas e tecnológicas, o setor como um todo continua estável. “O progresso foi na quantidade, mas do ponto de vista macro ficamos estável”, aponta o diretor da Fapesp, ao apresentar dados dos dispêndios brasileiros em CT&I. Em 2000, 54,61% dos investimentos no setor foram feitos pelos governos estadual e federal, enquanto as empresas privadas e estatais aplicaram 36,59%. Dados mais recentes do governo indicam que os índices permaneceram estáveis, sendo 55,93% de investimento público frente a 44,07% das companhias.
“Precisamos fazer um esforço para ver como os bilhões que são gastos geram resultados. O jeito de usar o dinheiro faz diferença. Uma política de Estado para CT&I precisa sinalizar o que queremos alcançar e não quanto queremos gastar. Parece que o objetivo é ter 2% do PIB aplicado em CT&I, mas o objetivo na verdade é fazer coisas para os brasileiros. Temos que perseguir a meta de impactos intelectual, social e econômico”, afirmou Cruz.
Reforma e integração
Carlos Américo Pacheco e Carlos Henrique de Britto Cruz apontaram que o principal benefício da evolução do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação foi fazer com que o tema entrasse efetivamente para agenda política. “De um jeito ou de outro, no plano federal, se consolidou a noção de que temos um sistema de inovação e que ele precisa de atenção para crescer. Sem reforma ficaremos parados”, destaca Pacheco.
Britto Cruz defende uma maior integração da esfera federal com os poderes estaduais e municipais. Devemos construir uma política de CT&I que, de fato, seja nacional. “A política de CT&I atual é mais federal que nacional. Nos estados e municípios existem atores que podem contribuir significativamente para o sistema”, alerta o diretor da Fapesp. “Paralelo a esse esforço, devemos focar nos impactos sociais, econômicos e intelectuais e aumentar a discussão pela melhoria e qualidade da aplicação de recursos.”
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