quinta-feira, 12 de maio de 2016

Fusão de ministérios é confirmada, apesar de desaprovação da comunidade científica

Jornal da Ciência
Viviane Monteiro
12 de maio de 2016

Sugestão de Pedro Cândido

Gilberto Kassab, presidente do PSD e ex-ministro das Cidades no governo Dilma, vai comandar a chamada pasta turbinada. (Foto: Elza Fiuza/Agência Brasil)





Pasta unificada entre MCTI e Ministério das Comunicações será comandada por Gilberto Kassab; Marco Antonio Raupp, ex-ministro de CT&I, vai chefiar secretaria para fazer elo com cientistas.
A fusão entre o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e o Ministério das Comunicações foi confirmada por fontes da equipe do vice-presidente Michel Temer (PMDB), apesar de contestações da comunidade científica. O peemedebista assume interinamente a Presidência da República a partir de hoje, 12, após a presidente Dilma Rousseff (PT) ter sido afastada do cargo pelo Senado Federal, com 55 votos a favor e 22 contra, numa sessão que durou mais de 20 horas.

A iniciativa de Temer faz parte da estratégia de enxugar a máquina pública, reduzindo de 32 para 23 o número de ministérios. Na proposta, o Ministério da Educação incorpora o Ministério da Cultura. Essa será uma das medidas do pacote de Temer, a serem anunciadas na tarde desta quinta-feira, em cerimônia de posse, na tentativa da retomada de crescimento da economia brasileira que enfrenta uma das maiores taxas de recessão da história.

Fontes confirmaram ao Jornal da Ciência que Gilberto Kassab, presidente do PSD e ex-ministro das Cidades no governo Dilma, vai comandar a chamada pasta turbinada. Anteciparam ainda que a secretaria de ciência, tecnologia e inovação da pasta será ocupada pelo cientista Marco Antonio Raupp, que comandou o MCTI de 2012 a 2014. A intenção é que Raupp ocupe a segunda cadeira mais importante da pasta, depois de Kassab, para poder fazer elo com a comunidade científica e minimizar as críticas à fusão da pasta de CT&I.

Graduado em física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), doutor em matemática pela Universidade de Chicago e livre-docente pela Universidade de São Paulo (USP), Raupp ocupou vários cargos em importantes instituições nas áreas de ciência e tecnologia. Foi diretor geral do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e diretor da Agência Espacial Brasileira (AEB). Hoje é diretor geral do Parque Tecnológico de São José dos Campos, cargo que já havia ocupado no período de 2008 a 2011 e que foi retomado após deixar a pasta de CT&I em 2014.

Descontentamento da comunidade científica

A comunidade científica desaprova a fusão entre as pastas de CT&I e das Comunicações. Na tarde desta quarta-feira, a SBPC, juntamente com outras 13 instituições, encaminharam um manifesto endereçado a Temer, alertando sobre os impactos negativos da unificação das duas pastas. Sob o título O MCTI É O MOTOR DO DESENVOLVIMENTO NACIONAL, o documento alerta que essa é uma medida artificial que prejudica o desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação do País, considerando a disparidade acentuada da missão duas partes.

“É grande a diferença de procedimentos, objetivos e missões desses dois ministérios. A agenda do MCTI é baseada em critérios de mérito científico e tecnológico, os programas são formatados e avaliados por comissões técnicas que têm a participação da comunidade científica e também da comunidade empresarial envolvida em atividades de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação. Essa sistemática é bem diferente da adotada pelo Ministério das Comunicações, que envolve relações políticas e práticas de gestão distantes da vida cotidiana do MCTI”, destaca o documento.

Em defesa de uma política de Estado

Antes mesmo de ser noticiada pela imprensa uma eventual fusão da pasta de CT&I, a SBPC e a ABC, na última sexta-feira, 06, divulgaram uma nota reforçando a importância da preservação do MCTI e suas agências, no caso de eventuais reformas administrativas.

“Consideramos, portanto, preocupante quando programas partidários de governo não vislumbram Ciência, Tecnologia e Inovação como um instrumento imperativo para alavancar o desenvolvimento econômico e social do País”, desta a carta, sob o título “Em defesa de uma política de Estado para a ciência, a tecnologia e a inovação”.

Na carta, as duas instituições científicas alertam que o aumento do impacto da ciência e da tecnologia brasileiras nas últimas décadas, com aplicações relevantes em vários setores da economia, deve-se a políticas de longo prazo. “Esse ciclo foi recentemente interrompido por cortes substanciais nos orçamentos do MCTI e do MEC, que paralisam redes de pesquisa, reduzem a oferta de bolsas, precarizam a investigação científica, a inovação e a educação”, destacam no documento.

Enquanto o governo brasileiro encolhe investimentos na área de ciência, tecnologia e inovação – área estratégica para o desenvolvimento de qualquer nação -, a carta da SBPC e da ABC alerta ainda que, em meio à crise global, a China investe pesado em ciência e tecnologia, ao prever investimento de 2,5% do PIB para 2020, com a esperança de que a inovação ajude o país a enfrentar a desaceleração econômica chinesa.

A presidente do Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência, Tecnologia e Inovação (Consecti), Francilene Garcia, também lamentou o fato de a ciência, tecnologia e inovação no Brasil ser colocada “à margem” e não ser tratada como estratégica para alavancar o desenvolvimento nacional e para que o Brasil possa enfrentar a crise econômica.

A presidente do Consecti reiterou que o papel do MCTI é fundamental para manutenção de políticas públicas e de desenvolvimento continuado na área de ciência, tecnologia e inovação. Ela reforça ainda que a ausência de um órgão que possa elaborar, reprogramar e estabelecer prioridades e atuar em segmentos estratégicos com foco nas ações de ciência, tecnologia e inovação será extremamente prejudicial ao País.

Francilene Garcia entende que se a pretensão do governo Temer é colocar o Brasil na rota do desenvolvimento sustentável, a área de ciência, tecnologia e inovação tem de ser considerada como a agenda prioritária.

“Se continuarmos a perder a dimensão dessas áreas estratégicas vamos cada vez mais ficar abaixo de todos os rankings econômicos sustentáveis”, alertou Garcia.

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