Jornal da Ciência, 6 de setembro de 2017
Na Reunião Anual da Sociedade Astronômica Brasileira, representantes de CNPq, Capes e SBPC discutem as diferentes formas de aferir a qualidade da produção acadêmica
Avaliar a pesquisa científica que se faz no Brasil é uma tarefa complexa. Embora a contagem de artigos publicados e outros parâmetros quantitativos sejam relativamente simples de aferir, uma avaliação mais precisa requer, também, uma abordagem qualitativa, que leve em consideração as particularidades de cada área do conhecimento. A avaliação da produção científica nacional foi tema de mesa-redonda na Reunião Anual da Sociedade Astronômica Brasileira (SAB), que acontece esta semana em São Paulo.
“Não é só a questão da quantidade de artigos publicados. Devemos considerar o seu impacto”, afirmou Mario Neto Borges, presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Ele mencionou que, embora a produção científica brasileira venha crescendo em quantidade desde a década de 1990, há pouco avanço em relação ao impacto dessas publicações.
Para Borges, a internacionalização da ciência brasileira – isto é, a circulação dos pesquisadores brasileiros em outros países, o estabelecimento de parcerias e o intercâmbio de cientistas estrangeiros no Brasil – tem o potencial de ampliar tanto a quantidade quanto o impacto das publicações científicas. “Esta é uma das missões dessa nova gestão do CNPq”, afirma o presidente, nomeado em outubro passado.
Ainda segundo ele, outra estratégia que pode potencializar o impacto da produção brasileira é o desenvolvimento de projetos de inovação em parceria com empresas. A transformação de conhecimento em riqueza, segundo Borges, ainda deixa a desejar. “Somos bem desenvolvidos em ciência, pouco em tecnologia e quase nada em inovação”, ponderou.
O coordenador da área de Física e Astronomia na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Sylvio Canuto, enfatizou que as diferentes áreas da ciência precisam de critérios de avaliação específicos, pois a dinâmica de publicação é diferente em cada uma. Ele defendeu, ainda, que é perigoso usar critérios de avaliação específicos para objetivos diferentes daqueles para os quais foram desenvolvidos – citou como exemplo o sistema Qualis, da Capes, que classifica as revistas científicas. O sistema, desenvolvido para avaliar a produção científica de programas de pós-graduação, em que a quantidade de artigos chega aos milhares, não é o mais adequado para avaliar, por exemplo, a produção individual de candidatos a um concurso público. “A estratégia e os procedimentos usados influenciam os resultados. Assim, a pergunta essencial é o que se pretende aferir”, pontuou.
Adiantando resultados que serão divulgados pela Capes ainda esta semana, Canuto avaliou que a área de física e astronomia no Brasil vem passando por um momento de crescente qualidade e quantidade. No período de 2013 a 2017, o número de docentes cresceu 8,7% e o número de publicações por ano, 17%. De maneira especial, o número de artigos publicados nas revistas mais importantes, classificadas no Qualis como A1, cresceu mais de 40%. “Esse crescimento não pode ser ameaçado”, disse, comentando a atual crise de financiamento na ciência brasileira.
Representando a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Lucile Maria Floeter Winter argumentou que os processos de avaliação não devem considerar apenas números, mas estar atentos especialmente ao mérito científico dos trabalhos. Essa lógica é ainda mais importante num momento em que, diante da escassez de verbas, torna-se necessário elencar prioridades de financiamento. “No momento atual, de crise, a avaliação é fundamental para que a qualidade seja premiada na distribuição de recursos”, destacou.
Winter alertou que a crise de financiamento da ciência que afeta o país não está perto de se resolver, e a previsão para 2018 é de ainda mais cortes. Por isso, é fundamental mostrar aos governantes e à população em geral a importância de pesquisa científica para o desenvolvimento do país. “A ciência, por estar atrelada à tecnologia e à inovação, é um dos setores que mais retorno dá de seus investimentos”, expôs. Ela lembrou o movimento da Marcha pela Ciência, cuja segunda edição aconteceu em várias cidades brasileiras no dia 2 de setembro. “As pessoas precisam saber que a ciência não é algo feito entre quatro paredes, que não serve à sociedade”, defendeu. Borges fez coro: “Para a sociedade como um todo e, portanto, para os políticos, a ciência ainda não é um valor. É isso que temos que mudar”.
Assessoria de imprensa da SAB
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