quarta-feira, 21 de abril de 2021

INPE explica corte de bolsa PCI e fim da previsão do tempo pelo CPTEC

Brasil Com Ciência
Shirley Marciano e Edmon Garcia
21 de abril de 2021 (programa 19/04)

Clézio de Nardin, diretor do INPE/BCC

O programa Brasil com Ciência entrevistou o diretor do INPE, Clézio Marcos de Nardin, que abordou diversos assuntos de interesse da comunidade e do grande público, dos quais destacamos o importante lançamento do satélite Amazonia-1; a descontinuidade de parte dos bolsistas PCI, que afetou o INPE e outros institutos de tecnologia; e o mais controverso de todos o temas, a mudança da previsão do tempo do CPTEC para o INMET. Vale conferir o resumo da entrevista.

Divulgação/Lançamento Amazonia-1


Brasil com Ciência (BCC):
Como foi o lançamento do Amazonia-1? Qual a experiência de estar num lançamento de satélite sob a perspectiva do diretor do INPE?
Clézio de Nardin: Quando a responsabilidade recai sobre si, a sensação é de alívio, quando tudo dá certo. 

BCC: O senhor chegou a ensaiar um discurso, caso não desse certo?
Clézio: É claro que eu estava mentalmente preparado para alguma falha, mas psicologicamente muito forte por causa [competência] da equipe. 

BCC: É possível mensurar o ganho tecnológico com a exitosa campanha do Amazônia-1?
Clézio: O INPE tem o know how [experiência], que poderá ser usado pela indústria brasileira, por exemplo, enviando os seus funcionários para fazer mestrado ou doutorado no INPE. E estamos trabalhando numa novidade, que se chama "Residência Tecnológica", no qual profissionais da indústria poderão fazer residência no INPE, e assim aprender todo o processo. É uma forma de levar o aprendizado para a indústria espacial. No pós lançamento você tem o satélite, que faz o monitoramento para diversas áreas. 

"O que houve foi algumas descontinuidades 
por questão de fluxo orçamentário, 
e isso causou problema no programa."

BCC: Por que os bolsistas PCI [Programa de Capacitação Institucional], que estavam atuando no Amazonia-1 e em outros projetos, foram dispensados?
Clézio:  O ministro Marcos Pontes deu conta do problema com as bolsas este ano. Ele procurou o CNPq e outros órgãos para resolver essa questão orçamentária do PCI. Nenhum dos bolsistas foi demitido e/ou teve a bolsa cancelada. O que houve foi algumas descontinuidades por questão de fluxo orçamentário, e isso causou problema no programa. 
Cada instituição tem seu foco. Cada cidadão tem o seu livre pensar, mas, dentro da instituição, como funcionário do INPE, o livre pensar está restrito à área Espacial e ao ambiente Espacial. Então, se a pessoa quer fazer pesquisa em outra área, ela é livre, mas não no INPE. O INPE é uma ICT [Instituto de Ciência e Tecnologia]. Esse problema de fluxo orçamentário foi sanado, e ele aconteceu porque o Congresso ainda não aprovou a LOA [Lei Orçamentária Anual]. Nós já estamos em abril. Então, o INPE está sofrendo, junto a outros órgãos. Mas, peço desculpas aos bolsistas pelo atraso no pagamento das bolsas. 

BCC: Daqueles 70 bolsistas, que estão dentro desse problema, quantos foram descontinuados por não estarem enquadrados nesse programa de capacitação? Estes que o senhor descreveu como detentores do direito de "livre pensar", mas que não estavam pesquisando assuntos de interesse do INPE.
Clézio: Quem define o projeto é o INPE, com a presença de um supervisor. Mas, alguns bolsistas, por decisão própria, não querem continuar nisso, e ninguém ficará preso àquilo que não gosta de fazer. Outros bolsistas atingiram o limite de tempo previsto na legislação. Hoje, um bolsista pode ficar até três anos. Em um caso mais raro, o bolsista pode ter sido desligado por questão de desempenho, avaliado pelo seu supervisor. 

BCC: Como servidor, o que o senhor acha dessa dúvida que o recém formado terá de onde irá trabalhar depois que passar o período das bolsas? 
Clézio: Me comove muito quando eu perco um servidor -- seja pela idade ou por algum programa de doutorado -- que quer continuar trabalhando e não consegue uma bolsa. Corta o coração principalmente quando vejo um jovem brilhante, que poderia estar sendo aproveitado. Por isso, estamos trabalhando para aumentar as possibilidades pela iniciativa privada, em projetos na área Espacial, que promovem parcerias com a indústria, inclusive incentivando a criação de startups. A outra possibilidade é criar uma OS [Organização Social] e contratar esse jovem, que eu sei que é especialista, que tenho o currículo dele aqui. 

Sobre os quadros do INPE, Clézio comentou espontaneamente.
Clézio: O quadro reduzido de servidores do INPE me preocupa muito, principalmente do pessoal da área Administrativa. Tem pessoas que defendem a criação de uma OS. Eu não vejo nenhum problema com isso, mas não acho que tenha que ser para o INPE todo. Por que o INPE não poderia ter uma OS, que prestasse serviço? Por ela também poderíamos, inclusive, contratar pessoas com maior facilidade, na medida que tivéssemos uma maior demanda de serviço. A cada pessoa do administrativo que eu perco, mais trabalho burocrático vai para o pesquisador, que poderia estar avançando na Ciência.  

"Não transformaremos o LIT em OS. 
Não é essa a minha proposta. 
O LIT é do INPE e ponto. "

BCC: Muito já se falou de transformar o LIT (Laboratório de Integração e Testes/INPE) em OS. Qual a sua opinião?
Clézio: Não transformaremos o LIT em OS. Não é essa a minha proposta. O LIT é do INPE e ponto. 

Reforma Administrativa:
"Não tenho experiência. 
Não posso dizer se sou a favor 
ou contra. Não tenho opinião formada."

BCC: Sobre a Reforma Administrativa, qual a visão do senhor sobre o estágio probatório e a avaliação que será feita pelo supervisor? 
Clézio: É uma prerrogativa de qualquer governo. Seja ele de direita ou de esquerda, tem direito de colocar suas opiniões no Congresso, o qual tem o dever de debater. A minha opinião pessoal é: eu gosto muito do modelo que a Unicamp usa. Ela tem uma avaliação continuada por nove anos. É muito semelhante e parece boa. Eu não tenho experiência. Não posso dizer se sou a favor ou contra [a Reforma Administrativa]. Não tenho opinião formada. Se a reforma é boa, ou não, não compete a mim dizer isso. 

"Prejudica ainda mais o INPE 
o fato do nosso orçamento ser 
disponibilizado através da 
AEB. Isso prejudica também o fluxo. 
Prejudica pelo duplo controle. 
Não vejo porque tenha 
que continuar desse jeito. 
É uma aberração do sistema"


"A primeira coisa é preservar os empregos. 
Na sequência, sim, teremos de reduzir 
contratos de limpeza, de segurança, 
contratos de terceirizados, porque não há recursos."

BCC: Como está a LOA para o INPE, caso seja aprovada sem alterações?
Clézio: Sobre o orçamento, vou ser sincero. É muito ruim. Não é bom. Todos os ministérios estão sofrendo [com os cortes]. Dentro do MCTI, o INPE está sofrendo um pouco diferente porque é uma das unidades maiores. Quando você trabalha com números absolutos, os associados ao INPE são muito maiores e, portanto, o sofrimento é maior. O número de pessoas e de atividades que estamos comprometendo é maior. 
Prejudica ainda mais o INPE o fato do nosso orçamento ser disponibilizado através da Agência Espacial Brasileira [AEB]. Isso prejudica o fluxo. Prejudica pelo duplo controle.  Não vejo porque tenha que continuar desse jeito. Não precisa, em hipótese alguma, ter que passar pela Agência, sendo que temos que prestar conta para o Ministério e somos subordinados ao MCTI. Isso, com todo respeito que tenho pela Agência, na minha opinião, é uma aberração do sistema. 
E a situação do INPE é muito grave. Já estamos conversando com o Ministério, solicitando recurso suplementar para agora, pelo risco de não conseguirmos atingir os pagamentos necessários até o final do ano. Temos avisado as autoridades e, hoje mesmo, recebi um e-mail que concede neste mês 1 milhão a mais para saldar contas que estamos deficitários. 
A primeira coisa é preservar os empregos. Na sequência, sim, teremos de reduzir contratos de limpeza, de segurança, contratos de terceirizados, porque não há recursos. Seria uma irresponsabilidade, se eu não fizesse isso. Então, esse ano vai ser um ano difícil. 


"
Alguns funcionários querem trabalhar 
na previsão do tempo. Tudo bem, 
sob a coordenação do INMET. 
O INMET vai fazer a previsão do tempo."

BCC: É verdade que a previsão do tempo sai do CPTEC e vai para o INMET?
Clézio: Nós vamos criar foco. O INPE fará modelagem [matemática meteorológica] e pesquisa. É nisto que o INPE é muito bom e indispensável. E, legalmente, o INPE não pode fazer a previsão do tempo. Não está no escopo dele. Existem decretos ministeriais regulamentando isso. Estamos fazendo um grande acordo para criar o sistema nacional meteorológico, onde cada um terá o seu papel. O INPE é o grande provedor de modelos. Alguns funcionários querem trabalhar na previsão do tempo. Tudo bem, sob a coordenação do INMET, pois é este órgão que fará a previsão do tempo. 

" A divulgação da previsão do tempo 
será feita pelo INMET, 
porque o mandato será dele."

BCC: Não seria um desperdício de know how passar a previsão para o INMET? E os funcionários do CPTEC vão ficar num limbo administrativo? Como vai funcionar isso? 
Clézio: Não ficarão num limbo, em hipótese nenhuma. Tem um acordo sendo assinado. Ninguém vai perder nada. Essas pessoas não serão colocadas na rua e nem de lado. Estamos criando um sistema inclusivo, e as experiências que eles têm serão absolutamente úteis para analisar, por exemplo, a saída do modelo. Mas a previsão oficial meteorológica é do INMET. A divulgação da previsão do tempo será feita pelo INMET, porque o mandato será dele. 

Veja a entrevista completa, no canal do programa de TV, Brasil Com Ciência. 





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