quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Mineração foi responsável por 9% do desmatamento da Amazônia entre 2005 e 2015

Estudo analisou imagens espaciais e as mudanças na paisagem em torno das 50 maiores minas ativas da Amazônia

Giovana Girardi, O Estado de S.Paulo
18 Outubro 2017 | 07h45
Atualizado 19 Outubro 2017 | 00h24
O debate que se acendeu no País no final de agosto sobre os riscos da mineração para a floresta, por ocasião da tentativa do governo federal de extinguir a Reserva Nacional de Cobre e Associados (Renca), acaba de ganhar uma boa dose argumentos científicos. 

Mineração foi responsável por 9% do desmatamento da Amazônia entre 2005 e 2015Desmatamento da Amazônia Foto: Tiago Queiroz/Estadão
O primeiro estudo já feito a mensurar o papel da mineração sobre o desmatamento da Amazônia revelou que a atividade foi responsável, direta e indiretamente, por 9,2% de toda a perda florestal registrada no bioma entre 2005 e 2015.
 
O alerta foi dado por um grupo de pesquisadores de universidades dos Estados Unidos, da Austrália e do Brasil em pesquisa publicada nesta quarta-feira, 18, na revista Nature Communications
O trabalho, liderado por Laura Sonter, que fez a pesquisa em seu pós-doutorado na Universidade de Vermont, analisou imagens espacias e as mudanças na paisagem em torno das 50 maiores minas ativas da Amazônia – só foi levada em conta a mineração autorizada; garimpos ilegais ficaram de fora. A ideia era medir não só o impacto imediato no ponto da lavra, onde a floresta é cortada para a exploração mineral, mas o desmatamento induzido para o funcionamento de toda a operação.

A descoberta é que o corte da floresta se estende por até 70 quilômetros além das fronteiras das lavras, em razão do estabelecimento da infraestrutura – como estradas, ferrovias e aeroportos – e da expansão urbana de suporte para o crescimento da força de trabalho. 
No período de dez anos avaliado, o desmatamento total induzido pela mineração foi de 11.670 km2. A maior parte disso – 90% –, aponta o trabalho, ocorreu fora do local de extração. Em outras palavras, a devastação fora das minas foi 12 vezes maior do que dentro.
Estimativas anteriores, comentam os autores do trabalho, eram de que a mineração respondia por apenas 2% ou 3% do desmatamento. "Era sabido que existia uma influência, mas ela nunca havia sido mensurada. Normalmente se pensa só no buraco, na cava, mas não é só isso. Junto com mineração vem toda a infraestrutura associada. O impacto indireto é muito maior", explica ao Estado o pesquisador Britaldo Soares-Filho, do Centro de Sensoriamento Remoto, Universidade Federal de Minas Gerais, e um dos autores do trabalho.

Ele afirma que perto das minas até existe preservação da floresta. "Em várias delas, a empresa estabeleceu um buffer de floresta no entorno, mas além disso, toda a infraestrutura, as siderúrgicas associadas à mineração de ferro, a migração populacional no entorno. Isso tudo obviamente acelera o desmatamento", diz.
Os autores alertam que os dados são importantes sobretudo quando se discute no Congresso a abertura de terras indígenas e unidades de conservação para a mineração. Hoje nas primeiras isso é vetado e só é autorizada a mineração nas UCs de uso sustentável. Além da ameaça que ainda paira de que a área da Renca possa voltar a ser extinta.
Soares-Filho destaca ainda que esse impacto da mineração também deveria ser levado em conta na discussão que ocorre neste momento de mudança no licenciamento ambiental para que ele se torna mais rápido, o que pode torná-lo bem menos restritivo.
Hoje para entrar em operação, as empresas têm de se submeter a esse processo, mas, em geral, ele não considera de modo sistemático os impactos além do local da operação ou fontes indiretas e cumulativas de desmatamento.
"O processo de licenciamento hoje como existe no Brasil já é muito falho por não considerar a cadeia de impactos. Esses empreendimentos avaliados passaram todos por licenciamento, mas ele só faz considerações ao redor. Isso não é só para a mineração, mas para hidrelétrica e todo o resto. Tem de haver uma avaliação dos possíveis impactos futuros", defende o pesquisador.
Procurado, o Ministério do Meio Ambiente não quis comentar a pesquisa. A pasta de Minas e Energia não se manifestou.

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