quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Deputados tiram R$ 120 milhões da Fapesp

Estadão
Blog do Herton Escobar
12 de janeiro de 2016

Prédio do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), um dos institutos de pesquisa do Estado. Foto: Ricardo Lima/Estadão

Orçamento foi alterado pela Assembleia Legislativa do Estado. Dinheiro foi redirecionado para financiar a "modernização" dos institutos de pesquisa estaduais, que sofrem há anos com falta de recursos humanos e financeiros. Lideranças dizem que ato é inconstitucional. Por lei, Fapesp tem de receber no mínimo 1% da receita tributária do Estado.

A Assembleia Legislativa paulista (Alesp) retirou R$ 120 milhões do orçamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para investir na recuperação dos institutos de pesquisa estaduais. Representantes da comunidade científica dizem que a medida é inconstitucional, pois viola o Artigo 271 da Constituição Estadual, pelo qual 1% da receita tributária do Estado deve ser repassado à Fapesp anualmente, no mínimo, “como renda de sua privativa administração”.
A projeto de lei orçamentária encaminhada à Alesp pelo governo do Estado previa um orçamento de R$ 1,344 bilhão para a Fapesp em 2017. 
Uma emenda apresentada pelas lideranças partidárias (incluindo a do PSDB, partido do governo) no dia da votação, porém, reduziu esse valor para R$ 1,224 bilhão. A diferença, de R$ 120 milhões, foi redirecionada para “projetos de modernização” do institutos de pesquisa do Estado — um conjunto de aproximadamente 20 instituições, que inclui os tradicionais Instituto de Botânica, Florestal, Agronômico de Campinas, Butantan, Pasteur e Adolfo Lutz.

A emenda que transfere os recursos para a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação foi publicada no Diário Oficial do Legislativo de 22 de dezembro. A própria Fapesp só ficou sabendo depois.

“Em 54 anos de existência da Fapesp, isso nunca aconteceu; é um precedente gravíssimo”, disse à reportagem a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader. “Tenho certeza que o governo e a Câmara vão rever isso, porque é inconstitucional.” A SBPC e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) enviaram uma carta de protesto ao governador Geraldo Alckmin, no dia 10, pedindo que ele “corrija tal situação”.
A Fapesp foi procurada na manhã de hoje para falar sobre o assunto, mas ainda não se pronunciou. A assessoria de comunicação da secretaria estadual limitou-se a dizer que o ato “foi um entendimento do Legislativo”.

O secretário da pasta é o vice-governador Márcio França, que não mantém bom relacionamento com a comunidade científica e, segundo fontes próximas ao governo e à fundação, vem pressionando para retirar recursos da Fapesp há algum tempo. O próprio governador Alckmin também se indispôs com o setor recentemente, ao dizer numa reunião que a Fapesp financiava pesquisas “sem nenhuma utilidade prática”.

“Gastam dinheiro com pesquisas acadêmicas sem nenhuma utilidade prática para a sociedade. Apoiar a pesquisa para a elaboração da vacina contra a dengue, eles não apoiam. O Butantã sem dinheiro para nada. E a Fapesp quer apoiar projetos de sociologia ou projetos acadêmicos sem nenhuma relevância”, disse Alckmin em abril de 2016, segundo revelado pela jornalista Vera Magalhães — então no Radar On-Line da revista Veja, hoje colunista do Estadão.

Segundo um influente pesquisador ouvido pela reportagem, o governo estaria tirando dinheiro da Fapesp para remediar sua própria negligência com os institutos de pesquisa do Estado. Há anos cientistas e funcionários desses institutos vêm denunciando o “sucateamento” dos institutos, que sofrem com a falta de recursos humanos e financeiros para manutenção de suas operações.
Uma reportagem do Estado já retratava essa situação em janeiro de 2014: Institutos de Pesquisa de SP perdem metade de seus funcionários e sofrem para manter vivo seu patrimônio científico e intelectual
Post atualizado às 16h, com informações adicionais.

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